sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

Leitura Íntima - Daniel Donson

Dezembro. Mês de nascimentos e renascimentos, momento de fazer um balanço geral, retrospectiva de mais um ano que se passa. E se a longevidade da vida é pautada numa seqüência indeterminada de anos, dezembro é o mês de um avivamento maior, sublime aspiração de um futuro que certamente chegará depois das onze horas do dia trinta e um.
Mas nenhuma data traz mais esperança do que o dia vinte e cinco. É bem verdade que no fundo da alma, todo mundo é um pouco triste e um pouco só. Entretanto, a esperança implacável implícita neste dia, nos faz transcender os sentidos físicos, limitações emocionais e enxergar algo além: o imaterial, o intangível – o sonho.
“Margarida a Violeta conhecia. Uma era cega e a outra bem louca vivia. A cega entendia o que a doida dizia. E acabou vendo o que ninguém mais via”. (Perto do Coração Selvagem – Clarice Lispector)
Compreensão, aproximação, união... São palavras intrínsecas a esta época do ano. Através de Margarida e Violeta é possível sentir de forma sutil que vale a pena permanecer de peito aberto independente das adversidades. Em detrimento da pluralidade das tradições religiosas multifacetadas, que estão mais em decadência do que nunca devido à ideologia massificada de consumo, devemos sim acreditar em Cristo – o Alfa, o Omega, o Messias – dar-lhe os parabéns – porque ele vive – e reconhecer nele a abundância colossal de um de um sentimento tão simples, tão solícito, tão altruísta e delicadamente essencial: O amor.
A legitimidade e necessidade de se amar é incontestável, embora haja certa carência de amor na Terra. Nenhum sofisma, ceticismo ou niilismo é capaz de refutar os benefícios adquiridos por aqueles que não desistem de amar. Refiro-me ao amor ágape, incondicional e desinteressado. Aquele que não se ufana, não se inflama de ciúmes, não se porta inconvenientemente, nem trata com leviandade. O outro amor é perecível e nocivo, pois de repente transforma-se em ódio por qualquer circunstância exterior. O verdadeiro amor não se apaga, não se torna obsoleto e é a raiz secreta da felicidade, da busca de... Sim, da busca de.
Especialmente no natal, todos parecem despender um pouco mais de amor do cofre e não se sente a poluição do ar como de costume. Suponho que seja pelo fato de que as coisas que realmente nos asfixiam e contaminam não estão do lado de fora, estão no recôndito do coração, nas avenidas ocultas dos que tem vida interior ativa.
Somente nesta ocasião somos tão induzidos a prestar atenção no nosso próprio reflexo, a nos observar como se estivéssemos em outra pele, a mergulhar no introspectivo para procurar subjetivamente razões objetivas para se viver e viver.
Encontrar o equilíbrio desejado e decidir ser feliz aqui e agora, não abandonado por completo a doce ilusão de que a plenitude está escondida no futuro, no amanhã – o pote no final do arco-íris.
Por tudo no universo ser uma grande verdade inventada, é fundamental permanecermos crendo no tudo e otimizando a todos. Chega de dizer. Está quase na hora da língua descansar. Hora de sentar, pensar e silenciar. O silêncio que é a oração dos sábios, sempre fala muito mais. O silêncio que é sempre uma conversa consigo próprio, um diálogo construtivo entre os muitos entes que nos compõe, uma autêntica leitura íntima.

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